Wicked: For Good
Apesar de todos os problemas presentes em Wicked (2024), o filme deriva de um material base sólido, tem um bom ritmo (mais ou menos), algumas músicas muito boas e duas grandes performances.
No caso de Wicked: Parte Dois (2025), o material base é historicamente conhecido por ser ruim e precisou ser expandido para que fosse possível a realização de dois projetos cinematográficos separados a partir de uma única peça, o que tornou o ritmo do filme absolutamente terrível. É um filme com excesso de eventos cujo peso é nulo. A sensação que fica é que a equipe, consciente que precisava justificar a existência de um segundo filme, decide atirar qualquer coisa com o mínimo de relevância social na torcida que algo funcione. Estética oriunda do fascismo? Temos. Mobilização populacional contra uma minoria? Temos. Perseguição de um estado contra um grupo oprimido? Temos. Uma mulher empoderada corrompida pelo poder? Temos. Acontecem muitas coisas, mas a falta de interesse do projeto em refletir sobre os temas que usa é tão baixo que, ao fim, o sentimento é de ter assistido um esboço de filme, muito rápido e raso.
As aspirações pseudo-políticas são risíveis desta vez. A ideia de usar animais para remeter aos judeus numa vibe meio Orwell por si só já é meio cafona em sua pobreza discursiva, mas até emocionalmente o filme faz muito pouco pra que esses animais importem, você deve sentir a dor deles através do discurso, não porque o filme desenvolve suas dores.
Também é no mínimo curioso que Elphaba seja vivida por uma mulher preta justamente pra que a cor verde de sua pele seja uma representação de raça naquele universo. Ainda assim, as revoltas populares do povo de Oz contra ela jamais confrontam o espectador com o motivo pelo qual aquelas pessoas se voltaram contra a única pessoa verde de Oz. É um olhar racial que não se permite ser trabalhado narrativamente, já que o grupo que efetivamente trama contra Elphaba o faz por motivos pessoais, não raciais.
A imagética fascista dos soldados macacos, dos milhares de pessoas reunidas, das bandeiras imponentes, está tudo a serviço de uma alegoria simplista. Sim, as pessoas são facilmente manipuláveis, e aí? O filme aponta um inimigo em comum mas tem muita dificuldade em investigar o nacionalismo que retrata visualmente.
Essa energia sisuda sem recheio se espalha pra outras áreas, as músicas por exemplo são horrorosas e com uma mesmice irritante, com exceção de Wonderful e For Good, que são prejudicadas pela direção. A segunda, tida como o clímax emocional do filme, foi capturada pelo diretor Jon M Chu sem nenhum traço de linguagem cinematográfica. A sequência é escura, chapada, não existe nenhum senso de espaço e nada acontece no fundo, que é quase totalmente preto e desfocado. É uma ideia de intimismo que esconde um desinteresse completo em criar imagens, em ser um filme musical. É um problema já recorrente nesses filmes mas que aqui atinge o ápice, por ser um filme que quer ser épico.
E sobre seu desejo de ser um épico, começo a questionar toda a expansão narrativa feita a partir da peça. Um diretor realmente interessado em criar um bom filme, em fazer uma adaptação de fato, se interessaria em transformar uma base fraca em algo novo através de uma reimaginação significativa. Mas o que vemos aqui são horas esticadas que se mantêm nos mesmos parâmetros da peça, apavorado com a simples ideia de ser qualquer coisa além daquilo que os fãs esperam. Para além de toda a pobreza estética e narrativa, o desejo de ser um fanservice o aproxima muito mais de um filme classe C da Marvel que algo de pedigree Broadway como os mais apaixonados argumentam. Fiquei me questionando por que manter todas as conexões exaustivas com a história original, trazendo uma comparação direta com o clássico. É um projeto tão covarde que ele insiste na ideia de reencenar todos os eventos relevantes de O Mágico de Oz, mas os personagens clássicos estão sempre de costas, sempre nos limites da tela, para que os fãs possam reconhecer os acontecimentos sem nunca precisar de fato lidar com eles.
Ao fim, a rebelião inteira que define Elphaba e Wicked é desfeita pela necessidade de justificar como tudo se encaixa no contexto do clássico. São personagens interessantes que se veem reféns de uma espécie de universo compartilhado, cujas regras não podem ser quebradas, afinal tudo precisa levar ao Mágico de Oz que todos conhecem. Como Elphaba desaparece na história original, ela também se vê forçada a sair de cena em Wicked, passando adiante aquela que deveria ser a luta de sua vida, que lhe custou tudo. A insistência de Elphaba para que sua imagem pública demonizada nunca seja desfeita por Glinda vai contra a própria ideologia do filme, afinal, que tipo de resistência é essa que aceita ser eternamente percebida através do olhar opressor? Salvar os animais com essa solução prática nunca soluciona essa falha moral de um filme que parece existir para vender a ideia de resistência enquanto reforça o status quo.
Wicked: For Good 2025
157 minutos
Direção: Jon M. Chu
Elenco: Cynthia Erivo, Ariana Grande, Jonathan Bailey, Ethan Slater, Michelle Yeoh, Jeff Goldblum, Peter Dinklage, Bowen Yang, Marissa Bode, Bronwyn James, Keala Settle
Roteiro: Winnie Holzman, Stephen Schwartz, Gregory Maguire



